Thursday, April 19, 2007

Pra começar, maçãs e patos

Minha primeira empreitada para outros ares no velho mundo foi no mínimo inusitada pra quem pretende dar uma de mochileiro. O combinado com o Daniel durante a semana era irmos para a Austria, mas só na véspera fiquei sabendo que Deutschlandsberg era o nosso destino. Onde? Eu também me perguntei! E para tornar a história mais interessante, ficaríamos hospedados na casa de um casal de amigos dele, em meio a uma plantação de macieiras, alguns patos e uma lebre que frequentava o local de vez em quando. Deutshlandsberg é uma típica cidadezinha do interior e fica perto de Graz, a segunda maior cidade da Austria, que mais tarde também iríamos conhecer.

O Daniel já tinha morado por 5 anos na Alemanha, em Karlsruhe (a 50km de Heidelberg), e estava de volta por três semanas para acertas umas coisas. Caiu como uma luva ter um amigo para me apresentar os hábitos e macetes que só quem mora no lugar conhece - como saber os lugares legais para sair e comer ou ter a manha de tirar o carrinho do supermercado do "gancho" sem passar vergonha (tem que por uma moedinha!).

Na sexta fui direto do trabalho para cidade dele e a noite fui conhecer, finalmente, a noite alemã. Quem me dera. Tupiniquim se junta mesmo em todo lugar e, para variar, vários brasileiros-germânicos formavam nossa roda já no primeiro barzinho - só não esperava conhecer uma das pessoas ali! Reconheci a irmã de uma amiga da faculdade no meio do pessoal. Como a maioria do grupo que estava lá, ela veio pra a Alemanha para fazer o doutorado. No meio da conversa descobri (já tinha ouvido rumores) que a famigerada sra. Fabiana, sua irmã, havia se casado e passa bem! Que mundo pequeno...

Degustei algumas heles e dunken Weissbiers (cerveja de trigo, clara e escura), apanhamos de uns alemães no totó (e olha que eu estava treinando depois do almoço com o Christian, todo dia!) e depois rumamos uma discoteca local - nada demais. Finalmente voltamos lá pelas tantas para casa, para uma boa noite de sono, pois o dia seguinte seria longo.

Acordamos tarde no sábado, comemos uns sandubas de autoria do Daniel, por sinal, fantásticos! Queijo feta (tipo minas, mas grego), pepino, maionese e salmão defumado eram os ingredientes. Embarcamos às 13h no Punto azul-smurf rumo ao nosso destino de Páscoa, distante 717km de nós. Mas não demorou tanto quanto eu imaginava...

As estradas na Alemanha são um capítulo a parte. Para ir de casa para o trabalho passo pela A5, uma das melhores autobanhs da Alemanha. 150km/h na pista do meio é completamente normal com pista livre. E sai da fente se você vir uma Ferrari, Lamborghini ou um comboio de Porshes no retrovisor! Doidimais!!! E para abastecer, nada de mordomia, é tudo self-service, até para piloto de Porshe. A benzin (gasolina) aqui é meio cara (1,30€), mas você não paga pedágio em lugar nenhum. E apesar de algumas poucas obras, ainda não vi nenhum buraco em pavimento algum. É bem o que o Ferraretto me disse: até a vedação da janela do banheiro da rodoviária é feita decentemente nesse país!

Como saimos tarde, não deu par parar em Müchen para reconhecimento, mas tudo bem, haverá outras oportunidades. O tempo de começo de primavera estava perfeito: visibilidade total e a temperatura na casa dos 18ºC. Full throtlle e avante! Depois de umas 4h de viagem, já perto da fronteira da Austria apareceu no horizonte a primeira montanha dos Alpes. A minha primeira lembrança foram aqueles quebra-cabeças que eu montava quando era criança na casa do Jarbas. P-Q-P! Lindo de morrer!

Infelizmente o carro não tinha navegação por GPS (comum por aqui, com direito à locução na língua que você quiser) mas, por sorte e graças ao roteiro impresso no
www.viamichelin.com, só nos perdemos no final do caminho, já perto da casa da Alline e do Hansu, em Deutschlandsberg (segundo a nossa amiga, é Dóitshláaaandsberg, com seu sotaque austríaco-alagoano) depois de quase de 8h de viagem. É, foi rápido até...

O casal é uma figura! Receptivos e amáveis como só os turcos e os nordestinos sabem ser. O Hansu não deixava a gente fazer nada, queria ser o melhor anfitrião do mundo. E o mais engraçado é que ele, sem se inibir nem um pouco com seu sotaque turco-alemão falava, em português mais do que fluente, mais do que nós três juntos!

Depois de muito discutirmos durante o jantar qual seria nosso destino para o passeio de sábado, decidimos pela Eslovênia. Viena já era conhecida de todos, menos eu :-( - ficou mais uma pro meu backlog... Partirímos logo cedo, então, para Liubliana. Parece nome de mulher, mas é a capital do país que antes foi parte da Iuguslávia. Eu e o Daniel jurávamos de pé junto que seria Bratislava a capital, mas tudo bem, no nosso tempo as aulas de geografia não incluiam esse país na lista de nomes que tínhamos que decorar! A Eslovênia, logo depois de se tornar um país independente foi chamada para fazer parte da comunidade européia e os resquícios do comunismo por lá são poucos.

Já no caminho, o primeiro episódio trágicômico do dia: fomos parados pela fiscalização de fronteira (o que não é regra) e viram que o carro do Hansu estava sem o vinete. Na Austria a gasolina é mais barata do que na Alemanha, mas se paga pedágio e ainda tem que colar esse selinho para poder andar nas Autobahns. Nosso motorista desavisado (mesmo estando há alguns meses na Austria), com seu chaveco furado, até que tentou, mas teve no final teve que pagar os 120€ de multa na hora. E depois ele ainda teimava que queria comprar o tal do selinho a qualquer custo, mesmo com a multa isentando ele disso por 2 dias. Lá não o vendiam, mas o rapaz só sossegou no final da noite quando achou um lugar na estrada que vendia.

Uma hora depois chegamos ao centro de Liubliana, muito bonito, que até parece cenário de filme do Fellini. E a impressão não era a toa, a gente tava do lado da Itália! Andamos pelo centro, visitamos algumas igrejas e procuramos um lugar para comer. A idéia era provar algo típico. Foi uma das comidas mais exóticas que já provei: carne de porco filhote com molho madeira, carne de veado (com E, não I!) com cereja (aí não tem jeito de consertar) e um bifão de sei lá o que com pimenta verde (pra manter a masculinidade) com os devidos acompanhamentos, - e uma cerveja local, ancestral da nossa Bohemia (no final da viagem vou tentar fazer um ranking) - tudo muito bom. Mais uma discussão depois do almoço sobre a próxima parada e o Hansu nos convenceu para conhecermos o que seria o cartão postal da Eslovênia.

Dessa vez não só parecia, mas era realmente uma paisagem de quebra-cabeças - inclusive vendido nas barracas para turistas. Um lago com uma illha com uma capela onde só chega de barco, rodeado por montanhas, os Alpes ao fundo e um castelo no topo do morro mais próximo. E para lá que nos encaminhamos, pouco antes do pôr-do-sol para apreciar a vista indescritível e tirmos uma porção de fotos.

Na volta para Deutshlandsberg até que tentamos comprar carne para um churrasco no domingo de Páscoa, mas tudo que conseguiríamos com os supermercados fechados seria abater algum animal silvestre, mas dada a hora do escurecer, decidimos não arriscar. Parecia premeditado, tudo conspirava para que não comessemos mais carne naquele final de semana. Chegando em casa, encontramos um bilhete na porta em alemão, só decifrável com ajuda de um dicionário, dizendo que a gente tinha atrapalhado a "celebração da consagração da carne" que tinha acontecido na capelinha ao lado do prédio durante aquela tarde. Na noite anterior, quando chegamos, estacionei o carro do lado da entrada do prédio, ao lado da capela pois não havia mais vagas e achamos que não haveria problema. E não haveria, se justo no dia seguinte fosse realizada a cerimônia naquele lugar. O coitado do padre só xingava a pobre da dona do lugar que não conseguia encontrar o dono do carro! A Alline até dormiu com peso na consciência nessa noite.

Na manhã seguinte vi a lebre no quintal convivendo pacificamente com um gato, tudo estava novamente em paz. Tomamos o café turco-austríaco, com direito a Kartoffelsalat, kiwis, azeitonas, pães, geléia e ovos e pegamos a estrada de novo. Dessa vez, para um pouco mais perto, Graz ficava à menos de uma hora de lá. Uma cidade bonita. Em 2003 ela foi nomeada capital cultural da Europoa. Eles dão esse título para promover o desenvolvimento de algumas cidades. E parece que funcionou - Graz tem vários atrativos que foram criados nessa época. Mas visitamos primeiro o centro histórico, com seus prédios antigos não destruído devidamente identificados. Em um deles, ficava uma das atrações turísticas da cidade. Um dos ancestrais do Hansu - um boneco simbolizando os turcos, que há alguns séculos invadiram essa e outras muitas cidades da Europa. Se houvia jazz na rua saídos de um sax e uma bateria. Muito bom.

Ao cruzarmos a ponte sobre o rio que divide o centro, nos deparmos com uma das cenas mais inusitadas que já presenciei. Um ser, não sei ao bem se era homem ou mulher, com sua roupa de neoprene, surfando (!) na correnteza do rio, com o apoio de uma corda amarrada à ponte. Ao lado da figura, continuando a caminhada, duas construções arquitetônicas muito interessantes. O Kurshaus, um museu que parece um Gughenhein, com sua arquitetura maluca, e a Mur Island, uma "nave" pós moderna no meio do rio Mur, com acesso às duas margens, que abriga um anfiteatro e um bar. Muito show de bola! Imaginei se um dia Barra Bonita vai ter um desses. Depois de uma cervejinha no sol de fim de tarde, ouvindo os sinos das igrejas batendo as 18h, rumamos para a Clock Tower, em cima do morro da cidade (pegamos o elevador dessa vez, sem titubear).

Na volta para casa, para não perder o costume, o Hansu gerou mais um episódio cômico. Simplesmente ele começou a discordar do navegador eletrônico (tudo bem que as vezes o GPS não tinha sinal, mas não era pra tanto), fazendo a gente andar algumas dezenas de quilômetros a mais, cruzando uma serra e várias cidadezinhas ao invés de irmos pela Autobahn. Eu, para não perder o costume, dormi.

Mas a viagem valeu por tudo. Não sabia que a Austria é como se fosse mais um estado da Alemanha, talvez um primo um pouco mais pobre. Inocência minha. Até o seu nome Österreich, ou reino do leste, leva à essa conclusão, mas meu alemão ainda é fraquinho para me avisar dessas coisas. E visitar a Eslovênia só me fez querer conhecer mais do Leste europeu. Conhecer lugares e pessoas interessantes e encantadoras, definitivamente, faz bem para alma.

Tschüss!

Para ver as fotos da viagem, clique em:
http://picasaweb.google.com.br/rnagumo/AustriaEEslovNiaAbril2007

Sunday, April 15, 2007

A minha casa

Guten tag,

Arrumar a casa geralmente não é uma coisa que eu faço sempre, mas pra essa visita virtual eu fiz que questão de deixar tudo bonitinho. Até no vídeo eu tentei caprichar ;).

http://www.youtube.com/watch?v=w-odmW-YOKY

Willkommen!

Wednesday, April 11, 2007

Heidelberg: Primeira Primavera





Chego ao novo velho mundo em uma época mágica. Na primavera os galhos adormecidos pelo inverno começam a surgir os primeiros brotos e o povo em todas suas as idades, começa a sair para as ruas e aproveitar a novidade do calor que dispensa os pesados casacos.

Meu primeiro programa em Heidelberg foi, como todos, passear pela Hauptstrasse (rua principal) numa tarde de domingo para tomar um sorvete (muitos estavam lá para uma gelada nas mesas espalhadas na rua fechada para pedestres, mas eu resisti à tentação dessa primeira vez) e apreciar as belas construções do da cidade antiga. Essa rua leva aos famosos Schloss (castelo) e à Alter Brücke (ponte velha), pontos obrigatórios para qualquer turista que se preze. Eu, como bom marinheiro recém aportado tinha que seguir o mapa, para não perder o costume. Mas a caminhada defitivamente valeu a pena, para uma primeira ótima impressão. Mas quero só ver subir a ladeirona que leva ao castelo toda vez que tiver visita por aqui (tudo bem que tinha a opção do elevador, mas a emoção não seria a mesma).

Esse é só o começo para conhecer a charmosa Heidelberg, penso eu. Essa pequena cidade, que hoje tem 140 mil habitantes, é palco de muita História. No começo do século XX foram encontrados aqui os primeiros vestígios de humanidade descobertos na Europa (datados de mais de 600 mil anos atrás!). Muito tempo depois, em 1386, foi fundada a primeira Universidade da Alemanha e pouco depois também a primeira biblioteca pública. Celtas, romanos, gregos e americanos já ocuparam esse chão (até hoje existe uma base dos EUA aqui). E foi na primavera de 1968, com o movimento estudantil, que encontrei o último registro histórico da minha rápida excursão.

Apesar dessa bagagem toda, a cidade do monte sagrado (que é o que significa Heidelberg em português) está longe de parecer um museu de antiguidades ou uma cidade medieval - tampouco lembra Guantanamo ou Paris. Ela tem sua identidade. Por causa da Universidade (bastante ativa) e das multinacionais que se instalaram nas redondezas (como a SAP em Walldorf, onde estou trabalhando) a presença de jovens e estrangeiros é maciça - eba! - e seu ar de cidade do interior com o turismo às margens do rio Neckar lembram um pouco a saudosa Barra Bonita. Esse peso dos estrangeiros na ocupação local faz com que o inglês seja suficiente para se comunicar praticamente em todos os lugares, por sorte minha.

Mas espero que a estada aqui também siva para que aprenda a língua do Goethe, Marx e do cara que inventou o bendito SAP. Dia-a-dia meu vocabulário germânico de utilidades vai aumentando. E o de futilidades também, principalmente graças ao alemão figura que trabalha comigo. Uma clássica que eu aprendi outro dia é fruto de uma propaganda de cerveja (mas que segundo o Christian foi caso verídico com um colega indiano na última Oktoberfest): de posse de um guia de conversação na mão, no meio da muvuca que é a Oktoberfest, você se dirigire ao garçom dizendo: Ich möchte diesen teppich nicht kaufen! Segundo o alemão clássico você dirá: "eu não quero comprar esse tapete". Mas o resultado vai ser, muito provavelmente, uma cerveja na sua mão em poucos segundos! Ou seja, pouco importa o que vai dizer numa grande festa alemã, o resultado provavelmente vai ser o mesmo! Isso é que é cultura avançada!? :).

Com o tempo, a adaptação à cultura local e as consequentes gafes invitáveis começam a produziram histórias engraçadas, como já está acontecendo. Mais as histórias de viagens que estão no meu mapa de vôo vão dar muito pano para manga para eu costurar esse blog. Só espero que a empolgação não seja passageira... porque a vontade de conhecer e desvendar a máquina do mundo não é.

Auf wiedersehen!